TAÇAS DE VINHO E OLHA QUE A GENTE FAZ!
. Preparo-me para escrever. Apanho uma taça, que em seguida se
multiplicará aos meus olhos. Abro uma garrafa de vinho, preferencialmente uma garrafa
de vinho tinto seco (preferencialmente qualquer tipo de vinho), e degusto com
muito prazer. Como um enólogo, aprecio cada gota, mas não se preocupe, não sou
daqueles que cheiram a rolha, deixo isso para os especialistas. Sou
especialista somente em bebê-lo.
E impressiona-me como as palavras surgem do nada, vão nascendo,
entreveram-se entre as linhas, às vezes uma por cima das outras, vão
transbordando como o vinho em meio às taças, e o significado etílico que as
palavras tomam, me levam a um mundo inacreditável, imenso, onde os meus olhos
brilham e onde o horizonte se multiplica. Quais sentidos por entre as margens?
Como explicá-las?
Tais palavras se misturam com o vinho derramado sobre as folhas, e chego
a imaginar os “cronopios” de Cortázar, como um desenho fora da margem, como um
poema sem rima.
O mundo das palavras é mágico, como acho mágico o ato de viver. Aprendo
com cada momento vivido, e uso cada ensinamento que a vida nos trás (às vezes
magnífico, às vezes doloroso) para transformar o mundo nem que seja um
pouquinho. E não se damos conta que somos nós mesmos que mudamos.
E o que o vinho me ensinou, mesmo nas entrelinhas das garrafas fechadas,
mesmo nos confins da infância, ensinou-me o valor de algumas coisas, que quero
compartilhar com vocês. De um tropeçar na calçada quando criança às “viagens”
inesquecíveis de um entardecer.
O mundo particular é tão imenso, que o meu escrever é apenas um grão de
areia em meio ao deserto. Mas se for infinito descobri-lo, que seja infinito
desvendá-lo.
A vida é bela, já diziam... Viver e beber da sua fonte, mais belo ainda.